sábado, 22 de outubro de 2011

Hoje, mais um dia, poderia ser como outro qualquer, mas assistindo ao Teleton, agente lembra que também é gente, reacende emoções e pára de olhar para o próprio umbigo e de reclamar por coisas tolas e sem sentido...
A vida é muito mais que buscas pessoais e egoístas!

quinta-feira, 25 de junho de 2009

eScREVeR

"Eu disse uma vez que escrever é uma maldição. (...) Hoje repito: é uma maldição, mas uma maldição que salva. Não estou me referindo a escrever para jornal. Mas escrever aquilo que eventualmente pode se transformar num conto ou num romance. É uma maldição porque obriga e arrasta como um vício penoso do qual é quase possível se livrar, pois nada o substitui. E é uma salvação. Salva a alma presa, salva a pessoa que se sente inútil, salva o dia que se vive e que nunca se entende a menos que se escreva. Escrever é procurar entender, é procurar reproduzir o irreproduzível, é sentir até o último fim o sentimento que permaneceria apenas vago e sufocador. Escrever é também abençoar uma vida que não foi abençoada... Lembrando-me agora com saudade da dor de escrever livros."

Clarice Lispector. A Descoberta do Mundo.

pALaVrA

Palavra grande, Palavra pequena,
Palavra rude, Palavra amena,
Palavra vazia, Palavra cheia,
Palavra bonita, Palavra feia,
Palavra discreta, Palavra insensata,
Palavra pensada, Palavra ingrata.
Palavra é o que A pessoa deseja
Que a palavra Se torne e seja.
(Vadevino)

Memorial de Leitura

Olá! Sou Kerleiane de Sousa Oliveira, mas pode me chamar de Kerla, nasci aqui mesmo em Caxias – MA, minha cidade do coração, mas foi em Divinópolis, um povoado com cerca de quarenta famílias, que vivi até os quatro anos de idade, minha mãe era direprofessodora, que quer dizer que ao mesmo tempo em que ela ensinava, organizava o lanche e ainda limpava a escola depois da aula.
Duas pequenas salas, uma de frente para outra, separadas apenas por uma porta que dava acesso ao quintal, era a escola, de cor amarela, com janelas de concreto pintadas de branco. Nosso quintal se confundia com o da escola e costumávamos brincar, meus irmãos e eu à sombra do enorme tamarineiro que sombreava tanto o nosso como o quintal da escola, havia também outras árvores, todas de grande porte, impetuosas, bem próximas umas das outras, o que nos possibilitou construir a casa da árvore mais linda de todo mundo, pelo menos pra nós.
A vida seguia na calmaria costumeira das áreas rurais, éramos quatro irmãos, dois meninos e duas meninas, e é nesse cenário que começa minha formação leitora, mamãe começou a ministrar aulas aos treze anos, casou-se aos vinte e um, não me lembro de passar um dia sequer sem vê-la com um livro na mão, ou com os livros espalhados à mesa, sempre livros didáticos, onde planejava e preenchia documentos escolares, o que acontece até hoje.
Mudamos para Governador Luiz Rocha em 1988, lembro-me perfeitamente daquele dia, os móveis sendo empacotados e colocados sobre um caminhão, nós também, colocaram o espelho da penteadeira envolto pelos colchões, que foi quebrado por uma pessoa que usou os colchões para brincar de pula pula, melhor mudar de assunto. Chegamos a nova cidade pela manhã, depois de atravessar à noite, a chuva, o frio... Era fevereiro e faltava um mês para meu quinto aniversário. A vida na nova casa não era muito diferente, a cidade conservava os mesmos hábitos dos lugares pequenos, mamãe continuou trabalhando como diretora, mas só diretora, que ninguém é de ferro, além disso, a escola era maior e tinha mais funcionários e uma área enorme, onde nós podíamos brincar de queimado, pular corda e elástico, boca de forno e tudo mais que a imaginação inventasse e coubesse até o tempo da sineta tocar, nessa escola, Santos Dumont, que eu estudei até a quarta série.
Mas não pensem vocês que foi assim as mil maravilhas não, ser filho do diretor da escola que você estudada o maior problema, você não pode nem pensar em sair um milímetro da linha que é a maior cobrança, eu também adorava a diresecretarioteca, que era uma salinha apertada onde funcionava desde a diretoria (uma mesa), a secretaria (outra mesa) e finalmente a biblioteca, uma estante de aço, com poucos livros, sendo que a maioria era didático, foi ali que fiz muitos amigos e fui a muitos lugares...
Eu adorava ir à escola, não faltava nem mesmo quando estava doente, apesar de ter que enfrentar muitos desafios, eu era uma menina magrela, dos cabelos ruivos, ou seja, um prato cheio para os meninos, que não me deixavam em paz, me chamavam de D. Josefa, a esposa do vigia da escola (seu Dotorzinho), enfim, foi nesse lugar que eu comecei a gostar de ler. E por falar em leitura deixa eu contar pra vocês como foi que eu aprendi ler, era sempre a mesma coisa, minha mãe com uma cartilha na mão e um cipó na outra, soletrava junto com agente, minha irmã e eu, e depois tínhamos que dizer a palavra, ao lado de cada palavra tinha uma figura, até ai nenhuma novidade, minha irmã, que era mais nova se saia muito bem, mas eu até hoje não aprendi a soletrar, a cena era mais ou menos essa: cheguêxiságachá (XA) erreóró (RO) pêépé (PE) e eu, que não entendia o porque de tanto som, olhava a figura e dizia, remédio, e daí por diante, xícara era café, e eu não dava uma dentro, para cada erro uma cipoada, eu deveria ter até aversão à leitura, não acham?
Mas graças a Deus eu não tenho nenhuma, adoro ler, onde foi que eu parei mesmo? Ah! Sim, ficava na “biblioteca” foi lá que eu conheci os contos de Green, o Ziraldo, Ana Maria Machado, o Monteiro Lobato... Depois que você passa uma barra dessas pra aprender a ler, quando você já aprendeu tem que usar esse trunfo a seu favor. Havia uma coleção particular que eu não me cansava de ler, era a coleção centopéia, eu lia e relia a Curiosidade superfaturada, Pinote o fracote e Janjão o fortão, A vaca Mimosa e a mosca Zenilda, ainda me lembro da textura das folhas, das cores das gravuras.
Lembro também de algo que eu adorava, como no interior faltava eletricidade, reuníamos todos a porta para ouvir as estórias de trancoso que os mais velhos contavam, eram histórias muito interessantes, cheias de detalhes, aventuras, monstros, era emocionante. Quando isso não acontecia líamos a luz de velas até cansarmos ou mamãe mandar agente dormir porque estava tarde. Lembro também que nesse período era comum os vizinhos ao receberem correspondências me chamarem para lê-las, às vezes eles até choravam e pediam para que relesse, sentia-me tão importante, ser achada digna da confiança, caprichava na leitura e as vezes me emocionava também.
Como já não tinha contato com novos livros, o jeito era se virar com didáticos mesmo, costumava responder as questões junto com minha irmã, ou então ficar treinando caligrafia. Os professores não liam para nós, às vezes liam o texto do livro e éramos obrigados a responder uma série de perguntas, que nem falavam realmente do texto, não era a mesma coisa de ler um livro com uma história instigante e que também não tinha perguntas sobre o que o autor diz ou acha, ou faça a análise do trecho. O livro trazia uma leitura descompromissada, só por prazer mesmo e agora essa história de copiar textos enormes e ainda fazer um exercício maior ainda sobre ele, não era bem o que eu esperava.
Tinha concluído a 8ª série quando vim morar aqui em Caxias para estudar o ensino Médio, no início eu parecia um bezerro desmamado, chorava sem parar com saudade da minha família, tinha 14 anos e nunca ficara longe dos meus pais, só que eu chorava escondido que não era pra ninguém ficar sabendo. Caxias era uma cidade bem maior do que eu estava acostumada, não conhecia ninguém da escola, estava acostumada a estudar sempre com as mesmas pessoas, desde a 1ª até a 8ª série e agora tudo havia mudado, só que nessa escola tinha biblioteca que agente podia entrar.
No começo fiquei um pouco tímida, mas logo fiz amizade com todo mundo, principalmente com a Rosarinha, adorávamos ir juntas à biblioteca. Líamos de tudo desde romances Sabrina, uma coleção enorme de livretos do Texas (do meu tio) à José Paulo Paes, Cristianne Gribel, Vinicius de Moraes, José de Alencar foi então que conheci Drumonnd e percebi que não havia só uma pedra no caminho. Decidi fazer faculdade pensava em ser médica, mas como uma vez desmaiei ao ver a enfermeira limpar um buraco na perna da minha irmã, desisti logo.
Fiz vestibular para Enfermagem, mas como estudei Magistério não estava apta a responder as questões de Química e Biologia com eficiência, voltei à Luis Rocha por insistência da minha mãe, fui trabalhar como professora, tinha 17 anos e me deram língua Portuguesa (duas 5ª séries e uma 6ª série), já que eu estudei fora, foi desafiador, lia todos os dias para meus alunos, cada nova poesia, conto, clássico, novela do Literatura em Minha Casa eu devorava junto com meus alunos; fazia gincanas, passeios de bicicleta, produção de textos no Pátio, descrição dos arredores da escola, queria fazer tudo diferente do que meus professores haviam feito comigo ( agora eles eram meus colegas de trabalho), não muito raro era chamada na diretoria porque minhas aulas eram um tanto barulhentas.
Não conseguia ficar em casa assistindo novela à noite, decidi me matricular no ensino Médio novamente, estudava junto com minha irmã e minhas primas, formávamos O Quarteto Maravilha, convenci minhas colegas a fazer vestibular, decidi fazer o curso de Letras Português, passei no vestibular e não deu mais pra continuar em sala de aula, estava tão contente. Era a primeira da família que conseguira essa proeza, logo de cara apaixonei-me por Literatura Universal, Dante, Homero, novas leituras, uma ressignificação do ato de ler.
Todas essas lembranças me fazem sentir como a personagem do Livro Curiosidade Superfaturada, querendo saber de tudo, entendendo a leitura como algo maravilhoso, que mexe lá dentro da gente, dentro da alma e sabe mais de uma coisa? Descobri o quanto eu preciso ler mais, mais e melhor, ler ler ler mais e mais ininterruptamente, pra me conhecer melhor, conhecer melhor o outro, refletir ou mesmo rir, mexer com as emoções, atiçar a curiosidade. Sabe de uma coisa vou agora mesmo procurar um bom livro? Até logo.